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19 de Abril de 2024

Cade profere primeira decisão sobre patentes essenciais

Publicado por Marcello Stutz
há 9 anos

Por Laura Ignacio

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) proferiu sua primeira decisão sobre patentes essenciais. No caso, permitiu que a Ericsson use medidas judiciais para impedir o uso de sua patente ­ relacionada à tecnologia 3G de telefonia ­ sem o pagamento de royalties.

Patentes essenciais implementam um padrão, que precisa ser usado por outras empresas para o desenvolvimento de novos produtos. Discussões a respeito são mais comuns nos órgãos antitruste da Europa, Estados Unidos, China e Coreia, mas a tendência é de crescimento no Brasil. Assim, a decisão sobre o caso da Ericsson é um precedente que poderá ser utilizado por outras empresas em futuros litígios.

A Superintendência­ Geral do Cade arquivou o processo de investigação aberto pela TCT, que comercializa a marca Alcatel no Brasil, contra a Ericsson. Esta última foi acusada de cobrar royalties abusivos ou recusar o licenciamento de sua patente de tecnologia, essencial para o padrão de telefonia 3G.

Na semana passada, o Cade negou recurso da TCT contra decisão do órgão favorável à Ericsson, determinando o arquivamento definitivo do processo investigatório. De acordo com a decisão, a TCT não apresentou fatos novos que motivassem a reconsideração da decisão.

Em junho, o órgão antitruste arquivou a denúncia por concluir que não haviam indícios de infração à ordem econômica para a instauração de processo administrativo. Entendeu que trata­-se de uma disputa privada, sem efeitos sobre o mercado de telefonia.

Além do 3G, outros exemplos de patente essencial são o DVD, o USB e o sistema touch. A patente essencial ­ ou standard essential patent (SEP) ­ é tão básica que sem ela outros produtos não poderiam ser desenvolvidos. Ela não consta na legislação antitruste brasileira, que fala apenas em "posição dominante" de algumas detentoras de patentes básicas, vedando o uso abusivo dessa posição no mercado. Mas órgãos internacionais especializados na elaboração de padrões colocam nos estatutos o dever de declarar quais são essenciais.

A declaração de essencialidade concede à empresa o direito exclusivo de receber royalties, mas o licenciamento deve ser negociado em termos "frand" ­ justos, razoáveis e não discriminatórios. Assim, os detentores dessas patentes são obrigados a vendê­las até mesmo para concorrentes em potencial.

No processo julgado pelo Cade, a TCT alegou que o ajuizamento de ações com pedido de liminares pela Ericsson, para a retirada do mercado dos aparelhos da TCT, tinha o objetivo de forçar a companhia a aderir a um acordo de licenciamento prejudicial à companhia.

"Ao violar seu compromisso de licenciar patentes como essenciais, cometeu [a Ericsson] infração concorrencial, agindo como se fosse um órgão regulador", afirma o advogado que representa a TCT no processo, Eduardo da Gama Câmara Júnior, do Dannemann Siemsen Advogados. "Além disso, argumentamos que existe uma discussão na Corte da Califórnia sobre diversas patentes essenciais da Ericsson, que definirá o valor dos royalties a serem pagos por suas licenças."

A multa por infração à defesa da concorrência no Brasil chega a 20% do faturamento bruto da empresa e, se há reincidência, pode ser dobrada, segundo a Lei nº 12.529, de 2011. Além disso, o artigo 38 da norma determina que "quando assim exigir a gravidade dos fatos ou o interesse público geral", a empresa pode ficar impedida de tomar empréstimo com bancos públicos ou, por até cinco anos, ficar impedida de exercer o comércio.

A Ericsson argumentou que ofereceu a licença em termos "frand" à TCT, que teria agido de má­fé ao prolongar as negociações por anos, enquanto usava a tecnologia da Ericsson sem contrapartida. Segundo o advogado Ademir Antonio Pereira Jr., do Advocacia José Del Chiaro, que representou a empresa no processo, a Ericsson recorreu ao Judiciário porque a TCT "fingiu querer licenciar", mas só protelou a assinatura de um contrato.

"A Ericsson não poderia aceitar as condições oferecidas pela TCT porque não compensariam seus investimentos em alta tecnologia", afirma Pereira Jr. "Além disso, a medida judicial não provoca impacto concorrencial porque a Ericsson não produz celular, então não compete com a TCT."

Segundo Pereira Jr., há decisão do Cade americano no sentido de que, se está comprovado que a empresa age com má­fé para não pagar royalties, é admissível a propositura de ações judiciais. Por outro lado, de acordo com Câmara, a Corte da Califórnia determinou a suspensão de todas as ações judiciais da Ericsson, enquanto não definir o valor dos royalties pelas patentes essenciais.

O advogado Vicente Bagnoli, presidente da comissão de estudos da concorrência da OAB­SP e professor do Mackenzie Direito, afirma que, por muitos anos, para proteger as empresas da concorrência, o direito à propriedade do bem industrial atrapalhou o desenvolvimento do mercado e a inovação tecnológica no país. "Hoje, a patente essencial existe para impulsionar novos mercados", afirma.

Para Bagnoli, quando a patente essencial é usada para limitar a competição no Brasil devem ser aplicadas as penas, conforme o artigo 36 da Lei de Defesa da Concorrência. O dispositivo estabelece que constitui infração à ordem econômica, independentemente de culpa, exercer de forma abusiva posição dominante, ainda que o objetivo não seja alcançado.

Mas o professor pondera sobre o uso do Judiciário e do Cade nesses litígios. Ele afirma que, se a empresa quer utilizar uma patente essencial, mas não consegue negociar um valor em termos "frand", por exemplo, pode recorrer a ambas as instituições. "Mas, no Judiciário, se ao final seu pedido for considerado improcedente, arcará com as custas do processo e a sucumbência", afirma. "No Cade, o pedido improcedente não teria repercussões para a empresa. Contudo, a detentora da patente poderá acusá­la por abuso de petição ou 'sham litigation', diz.

Para o advogado Alexandre Ditzel Faraco, do Levy & Salomão Advogados, a questão da patente essencial é polêmica porque sua proteção estimula o investimento em inovação, mas em excesso também pode limitar a criação de novos produtos." O contraponto que o direito concorrencial faz é importante para estabelecer um equilíbrio ", afirma.

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